Não sei, eu
tenho saudades de escrever mais. Narrações. Dissertações. Resumos. Copiar
letras de músicas. Fazer aquelas letras todas enfeitadas. Pensar. Reflexões
sobre a vida e sobre coisas muito mais banais que ela. Escrever com canetas
coloridas e destacar as palavras mais importantes. Escrever a resolução do
problema de física em um guardanapo numa pizzaria. Escrever cartas e enviar
pelo correio. Ficar na fila e ver a reação de espanto do atendente ao ver o
envelope com endereço escrito à mão e uma guria falando “carta comum”. Ou
entregar a carta pessoalmente mesmo.
Eu sinto
saudades de pegar a máquina de escrever laranja da minha mãe às escondidas e
ficar batendo nas teclas só para ouvir aquele barulhinho gostoso. Tec, tec,
tec, tec, tiiiiim! Às vezes eu nem escrevia nada de mais, só algumas frases
aleatórias. Diálogos de Alice no país das maravilhas. Ou o nome completo do Dom
Pedro I. Ou o meu nome. Ou só algumas letras perdidas mesmo. Para tentar
entender como aquelas curvas funcionavam e tentar reproduzir a simpática fonte
das máquinas antigas com caneta em algum papel de rascunho que sobrava em casa.
E então eu
me dei conta de que não escrevia assim há mais de ano e meio. Desde quando
comecei engenharia. Percebi que, desde esse momento, a única coisa que escrevia
era uma mera cópia das lousas bagunçadas dos professores. As únicas letras que
eu colocava no papel eram as incógnitas das equações nas aulas de cálculo.
Percebi que as únicas frases que eu articulava eram para compor o texto de
algum relatório.
E então eu
parei pra pensar em como isso estava me fazendo mal. Não só a falta de
escrever. Tudo. Me dedicar tanto a uma coisa que eu nem sei se gosto.
Negligenciar uma parte de mim que é quase maior que eu mesma. Parar de
escrever, ver filmes, cantar no chuveiro, cozinhar, andar por aí sem rumo
definido, deitar na grama e fingir que entendo de astronomia, ler, deitar no
chão e prestar atenção na minha respiração enquanto ouço uma música qualquer.
Tudo isso pra poder ter tempo de estudar, de estudar, de estudar. Esquecendo de
viver. Talvez não fosse só uma falta de tempo. E sim uma má colocação de
prioridades. Talvez a prioridade deva ser ser (que bizarro essas duas palavras
iguais e seguidas) feliz.
Então eu
percebi que não. Não dava pra ser sempre assim. Um ano e meio já fez mal o
suficiente. Me deixou com um bando de pilhas na cabeça. Com um bando de
dúvidas. Com vontade de pedir socorro. Sem um bando de cores. Sem um bando de
poesia na vida. Um ano e meio e o brilho do olho foi todo embora. E que se eu
quiser me formar, seja em engenharia ou em qualquer outra coisa, eu ia ter que
mudar. Ou simplesmente não ia dar.
Provavelmente
isso (escrever essas coisas aleatórias) não vai me deixar totalmente melhor.
Mas já é um começo. Algo que vai me forçar a continuar andando. A olhar pro céu
de noite e tentar reconhecer Saturno. A olhar pro brigadeiro na panela e
enrolá-los. A parar para respirar. A tentar achar um motivo. Um porque. Alguma
coisa. E enquanto isso, eu vou escrevendo.
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